16 fevereiro, 2009

Fragmentos Ailimísticos*

A repetição da rejeição é um sinal. Não que eu sofra exatamente por você ou por aqueles que assim fizeram, mas como eu pude me permitir a não perceber que seria assim. Era uma seqüência dentro de todas as minhas aproximações. As aproximações vinham naturais, daqui para lá como de cá para depois. Reciprocidade eu diria. Mas de lá vinha sempre distorcido e eu farejava pingos de água turva caindo como goteira na minha frente. Olhava a todo instante, igual sempre. Não via nada daquela gota. Daquela água instável e ao mesmo tempo respeitosa de um ciclo de pingos que iam, caíam, iam, caíam onde tinham que cair. Não existiam problemas daquela goteira estar na minha frente, era até um sonoro delimitar de tempo sem prejudicar no meu espaço. Corria no espaço se a deixasse, e só faria isso. Leve e cadente, sempre. Já estava gostando dela. Começava então a guardar a sua água caída. A goteira nem se lembrava mais daquilo que se foi. Minha tigela se enchia. Suspirava ao ver os progressos. Comovia-me facilmente. Não via mais “gota e gota” e não pretendia contá-las, mas elas todas juntas já eram tantas que nem sei. Nem sabia o que formavam. Sutilmente trocava as tigelas. As gotas iam para um vaso e viam as folhas crescerem. Tudo no seu devido encaixe. Eu observava tudo. Os pequeninos acontecimentos daquele buraco pequeno no meu quarto vazio eram permitidos somente porque eu me ria por dentro. Achava que compreendia donde vinha toda aquela água. Para mim, não precisava saber. Quando o teto começou a rachar, as gotas ficaram aceleradas e o meu dia andava correndo com pressa para nada. Queria saber mas não podia. Tinha um teto que me protegia de ver a natureza das coisas. Ele rachava. Quando o teto caiu sobre a minha cabeça, fiquei desacordada por um tempo até que me desse fome. Tonta procurei olhar para cima. Um teto mais largo, mais comprido e que durou um pouco mais.

Funcionava sim. Eu aprendia que a minha sensação de que não andava bem era intuição de que aconteceria a queda do teto. Gradativamente eu dizia que aprendia algo novo, não confiava nas pessoas tanto assim. Não escutava o discurso até a última palavra. Não fazia favores. Não fazia tudo isso, eu pensava em tudo isso. E toda a vez que o teto caía, levantava molhada, com o lábio roxo, com a cabeça doendo, e com o peito recordando com aperto de que o teto não me protegia era nada. Quem me ensinou a viver desta maneira? O mundo ali era cinza e eu queria ao menos o preto e branco. O teto era bonito, sempre pronto para me trazer uma nova goteira, uma nova rachadura e uma queda. Se ao menos sentisse dor de ser sozinha, quebraria as paredes e tetos todos que me fechavam o olhar, e buscaria a possibilidade de ver outros como eu

Eu não existo
Eu não existo para você
Eu não existo para você porque
Eu não existo para você porque eu quero
Eu não existo para você porque eu quero sumir
Eu não existo para você porque eu quero sumir da sua frente
Eu não existo para você porque eu quero sumir da sua frente até a saudade
Eu não existo para você porque eu quero sumir da sua frente até a saudade passar
Eu não existo para você porque eu quero sumir da sua frente até a saudade passar a ser maior
Maior do que isso
Até o amor
Fimdalinha

* Ailime Huckembeck. Ela permitiu e por isso estão aqui as linhas. fimdalinha, eu copio, e beijo o coração.

2 comentários:

B. disse...

Pronto, acabou.

Mitras disse...

òtimo Dani.
ótimo, muito bom mesmo.